Caro leitor,
Você viu a notícia?
O Banco Central divulgou que a dívida pública bruta do Brasil deu uma recuada em março.
Caiu para 75,9% do PIB.
Parece um bom sinal, não é?
Um passo na direção certa.
Talvez você tenha lido a manchete e sentido um certo alívio.
“Ok, o Brasil está melhorando”, pensou.
“A situação fiscal está sob controle”.
Mas… e se eu te dissesse que essa “boa notícia” pode ser, na verdade, uma espécie de miragem?
Uma ilusão matemática que esconde um problema sério e crescente?
Pois é.
No mundo das finanças públicas, nem sempre o que parece é.
E olhar apenas a manchete, sem mergulhar nos detalhes, pode te levar a conclusões perigosas.
É como ver um paciente que perdeu 200 gramas na balança e comemorar, ignorando que a pressão arterial dele disparou.
O número na balança (a Dívida Bruta/PIB) parece melhor.
Mas o risco sistêmico (o custo da dívida) aumentou.
Vamos desvendar essa história.
O número de 75,9% do PIB para a dívida bruta em março veio acompanhado de alguns detalhes cruciais que mudam a história por completo.
A variação na dívida bruta foi influenciada por alguns fatores.
Dois deles puxaram para baixo.
O primeiro foi o efeito contábil do crescimento do PIB.
Isso mesmo.
O PIB cresceu.
E quando o PIB cresce, a dívida, medida como proporção dele, diminui automaticamente.
Mesmo que o valor absoluto da dívida não tenha diminuído tanto assim.
Pense nisso como você tirando uma foto de um objeto.
Se você aumentar o tamanho da foto (o PIB), o objeto (a dívida) vai parecer menor em comparação.
Mas o objeto em si não encolheu.
Esse “efeito PIB” tirou 0,6 ponto percentual da dívida bruta no mês.
Foi o principal fator da queda percentual.
O segundo fator que ajudou na queda foi o resgate líquido de títulos públicos.
Isso significa que o governo pagou mais dívida do que emitiu no período.
Algo positivo, sem dúvida.
Esse fator contribuiu com uma redução de 0,3 ponto percentual.
Somando os dois, temos 0,6 + 0,3 = 0,9 ponto percentual de “alívio”.
Parece ótimo.
Não parece?
Mas aí vem o vilão oculto.
O elefante na sala.
Aquele detalhe que poucos dão a devida atenção.
Os gastos com juros da dívida.
Enquanto o PIB e o resgate de títulos ajudavam a puxar o número da dívida bruta para baixo, os gastos com juros pressionaram para cima.
E pressionaram FORTE.
Geraram um aumento de 0,8 ponto percentual.
Você percebe o que aconteceu aqui?
O “ganho” de 0,9 p.p. vindo do crescimento do PIB e do resgate de títulos foi quase inteiramente anulado pelo custo crescente da dívida.
Pelos juros que o país precisou pagar.
É como correr para alcançar a linha de chegada (reduzir a dívida), mas com um peso nas costas (os juros) que fica cada vez mais pesado, te puxando para trás.
Você avança, mas o esforço é brutal e o progresso real é mínimo.
Esse é o custo real do dinheiro para o governo.
E ele está alto.
Muito alto.
E não para de crescer em termos absolutos, mesmo com essa pequena melhora na proporção PIB.
Mas a história não para por aí.
Olhando mais fundo nos números do superávit primário de R$3,588 bilhões em março, você descobre outro detalhe interessante.
De onde veio esse superávit?
Veio principalmente dos governos regionais (Estados e Municípios).
Eles tiveram um superávit de R$6,460 bilhões.
Um número robusto.
Mas o Governo Central…
Aquele que gera a maior parte da dívida que estamos discutindo…
Teve um déficit de R$2,305 bilhões.
E as empresas estatais também tiveram um déficit de R$566 milhões.
Ou seja, o superávit “geral” foi, na verdade, uma “colcha de retalhos”.
Onde o principal responsável pela saúde fiscal do país (o Governo Central) ainda está no vermelho…
Dependendo do desempenho dos governos regionais para apresentar um número positivo consolidado.
Isso levanta uma questão importante sobre a sustentabilidade desse superávit.
E tem mais.
O Banco Central também divulgou a Dívida Líquida do setor público.
Essa, sim, subiu.
De 61,4% para 61,6% do PIB em março.
A Dívida Bruta olha para o total de obrigações do governo.
A Dívida Líquida considera os ativos que o governo possui.
Se a Dívida Bruta “cai” (em proporção) principalmente por efeito PIB e é quase anulada pelos juros…
E a Dívida Líquida sobe…
Qual filme estamos assistindo?
O quadro é, sem dúvida, mais complexo e menos animador do que a manchete inicial sugeria.
“Ok, Hugo, mas por que isso importa para mim? Para os meus investimentos?”
Importa MUITO.
Esse cenário de dívida alta e, principalmente, de custo crescente da dívida, tem um impacto direto no seu bolso.
Para financiar essa dívida e pagar esses juros, o governo precisa emitir títulos.
E para atrair compradores para esses títulos, em um cenário de risco fiscal e juros altos, ele precisa pagar bem.
Precisa manter a taxa Selic alta.
Juros altos têm ramificações por toda a economia e pelo mercado financeiro:
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Renda Fixa: Juros altos tornam a renda fixa (como Tesouro Direto) muito atraente. Isso é bom para quem está nela, claro. Mas também compete diretamente com a renda variável.
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Renda Variável (Ações): Empresas sofrem com juros altos. O custo de capital aumenta, o crescimento pode desacelerar. Além disso, como mencionei, a renda fixa se torna um concorrente forte por capital. Isso pressiona as ações para baixo ou limita o potencial de alta.
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Inflação: A dinâmica fiscal e a necessidade de financiar a dívida podem ter efeitos na inflação a longo prazo, corroendo o poder de compra do seu dinheiro e dos seus investimentos.
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Confiança do Investidor: Um quadro fiscal que, no fundo, não mostra melhora estrutural contundente, mas sim um custo crescente, mina a confiança dos investidores. Especialmente os estrangeiros. Isso pode levar a menos investimento no país, pressionando o câmbio e os preços dos ativos.
Ou seja: essa discussão aparentemente distante sobre “dívida pública” afeta diretamente o ambiente em que seus investimentos performam.
Afeta quanto seu dinheiro rende ou perde valor.
A lição aqui é clara: não se contente com a superfície.
Não se deixe seduzir por manchetes que parecem boas demais para serem verdadeiras.
A “queda” da Dívida Bruta/PIB em março foi um passo pequeno, impulsionado em grande parte por um efeito contábil (o PIB crescendo) e quase ofuscado pelo peso crescente dos juros.
O superávit veio de onde não resolve o problema central.
A Dívida Líquida, que olha o patrimônio líquido do governo, subiu.
A verdadeira saúde fiscal do Brasil não está na foto de um mês, mas no filme de longo prazo da sustentabilidade da dívida.
E esse filme, infelizmente, ainda mostra um vilão poderoso no cenário: o custo dos juros.
Entender essa dinâmica complexa, olhar além dos números óbvios, é crucial para proteger seu patrimônio e tomar decisões de investimento realmente conscientes.
Na Senhor Mercado, nosso compromisso é com essa clareza.
Com a análise profunda.
Com a honestidade que te mostra a realidade, não a ilusão.
Porque informação transparente e análise fria dos dados são, no fim das contas, os seus melhores ativos no mercado.
Atenciosamente,
Hugo Teixeira
Consultor de Valores Mobiliários Autorizado pela CVM; Especialista de Investimentos Certificado pela ANBIMA; Trader e Investidor Profissional há 17 Anos
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