Caro leitor,
Você viu a manchete?
Aquela que anunciava “FIIs elevam em até 200% os dividendos de julho”?
Ou a que mostrava o HGRU11 subindo 72,2% nos proventos, e o HGRE11 com um salto de 200%?
A primeira reação para muitos, eu sei, é um misto de cobiça e desespero.
Aquele frio na barriga, a calculadora mental já gritando:
“Se eu tivesse colocado meu dinheiro lá…!”
“Droga, perdi de novo!”
É o famoso FOMO, o medo de ficar de fora, batendo à sua porta.
Afinal, quem não quer ver seu dinheiro se multiplicar tão rápido, não é mesmo?
Quem não sonha com aquela renda passiva que parece cair do céu?
Mas e se eu te disser que a reação correta, a reação de um investidor que realmente ganha dinheiro nesse jogo, não é nenhuma dessas?
A reação correta é a desconfiança.
Porque esse dividendo de 200% não é um bilhete premiado.
É, na verdade, o canto da sereia mais perigoso do mercado.
E hoje, vou te mostrar como tapar os ouvidos e navegar em segurança, enquanto os outros navios, iludidos pelo brilho, naufragam.
Vem comigo.
Você está prestes a desvendar um dos maiores segredos (que não são segredos) por trás dessas manchetes bombásticas.
Primeiro, vamos à “mágica” desvendada: de onde realmente veio esse dinheiro?
Pense na seguinte cena:
Você tem uma pequena fazenda.
Com dez vacas leiteiras.
Todo mês, elas produzem leite.
Essa é a sua renda consistente. Seu dividendo de verdade.
Agora, imagine que em um determinado mês, além do leite normal, você decide vender uma dessas vacas.
E, por acaso, você a vende por um preço excelente, muito acima do que ela valia quando você a comprou.
Sua renda naquele mês, contabilizando o leite e a venda da vaca, explode!
Você vai dizer: “Que mês fantástico! Minha fazenda deu um lucro fenomenal!”
E é verdade.
Mas, e no mês seguinte?
Você agora tem nove vacas, e não dez.
Sua capacidade de gerar leite, ou seja, sua renda recorrente, diminuiu.
O que o mercado está vendendo como “dividendos extraordinários” de FIIs é exatamente a venda dessa vaca.
O HGRU11, por exemplo, elevou seus proventos impulsionado pela venda de um imóvel na Rua Quatá.
O HGRE11 fez algo similar.
O dinheiro não brotou dos aluguéis, da performance orgânica dos imóveis que continuam gerando renda.
Ele veio da venda de um ativo.
É um ganho de capital, não uma melhora na capacidade de gerar renda passiva contínua.
Você não ficou mais rico de verdade; apenas liquidou parte do seu patrimônio e o dinheiro foi devolvido a você.
É como trocar um tijolo que você “possuía” por dinheiro.
Muda toda a percepção, não é?
Mas espere, tem mais uma camada de complexidade aqui.
Muitos olham para o gestor do FII e pensam: “Que gestor generoso! Pagou um dividendo tão alto!”
Mas a realidade, como quase tudo no mercado financeiro, é muito mais prosaica.
Não há generosidade aqui.
Há, sim, a Lei.
Você sabia que, para cumprir a legislação brasileira, os FIIs são obrigados a distribuir 95% dos lucros em regime de caixa a cada semestre?
Isso mesmo.
Não é uma decisão bondosa do gestor para premiar o cotista.
É uma obrigação legal.
Ele não está tirando dinheiro da cartola para você.
Ele está administrando um fundo dentro das regras estabelecidas.
E se o fundo realiza um ganho de capital significativo, como a venda de um imóvel com lucro, ele precisa distribuir a maior parte desse lucro.
Essa é a parte que desmistifica a figura do gestor como um mago.
Ele é um administrador, um profissional que opera dentro de um conjunto de regras e um cenário de mercado.
Compreender isso remove a emoção da análise e a traz de volta para a lógica e a racionalidade.
Essa compreensão é vital para evitar o que eu chamo de “Armadilha do Dividend Yield Fantasma”.
Olhar o dividend yield de um FII logo após um evento não recorrente, como a venda de um imóvel, é como medir a temperatura de um paciente com febre altíssima e assumir que essa será sua temperatura normal para sempre.
É uma leitura pontual, influenciada por um evento não repetível.
Vamos a um exemplo prático que vi acontecer:
Um FII, vamos chamá-lo de FII “X”, pagou R$ 2,25 em dividendos em julho, com a cota a R$ 100.
Uau, 2,25% de dividend yield em um único mês!
A manchete gritaria: “FII X Paga 27% de Dividend Yield Anualizado!”
Parece incrível, certo?
Mas se o dividendo recorrente desse FII, aquele que vem dos aluguéis consistentes, é de apenas R$ 0,85 por cota ao mês…
Então o dividend yield real que você deve esperar para o futuro é de 0,85%.
O investidor que compra o FII “X” esperando receber 2,25% de dividend yield todo mês está comprando uma ilusão.
Ele está investindo na memória de um evento passado, não na capacidade de geração de renda futura do fundo.
E isso nos leva à Pergunta de Ouro que separa o investidor perspicaz da multidão.
O investidor comum, o turista na bolsa, pergunta:
“Quanto o FII pagou em dividendos no último mês?”
Já o investidor da Senhor Mercado, o investidor que realmente entende o jogo, pergunta algo muito diferente:
“O que sobrou no portfólio depois que ele pagou esse dividendo ‘extra’?”
Essa é a questão crucial.
A venda do imóvel foi estratégica?
Venderam um ativo que era um fardo, uma “vaca magra” que dava pouco leite, para liberar capital e talvez investir em algo muito melhor no futuro?
Ou, pelo contrário, venderam a “joia da coroa”, a “vaca mais leiteira”, apenas para distribuir um grande valor e inflar artificialmente os dividendos, deixando o fundo com um portfólio mais fraco e menos rentável no longo prazo?
A qualidade do que fica no portfólio do FII é infinitamente mais importante do que o dinheiro da venda que já foi distribuído.
Se o fundo vendeu um bom ativo, isso pode significar uma redução da sua capacidade de gerar renda recorrente nos próximos meses, até que um novo ativo seja adquirido e comece a gerar retorno.
E se o gestor vender um ativo e não conseguir reinvestir o dinheiro em algo que gere tanto ou mais valor, o fundo pode se tornar menos interessante com o tempo.
Afinal, a valorização das cotas, para nós, é tão ou mais importante que o dividendo.
Um dividendo gordo, mas que vem de um patrimônio em deterioração, não é ganho de verdade. É a ilusão de um ganho.
Da próxima vez que você se deparar com uma notícia sobre um “superdividendo” de FII, sorria.
Não com cobiça, mas com sabedoria.
Você não verá mais um prêmio, mas um quebra-cabeça. E agora, você tem as peças para montá-lo.
Lembre-se: o mercado financeiro é um oceano. A maioria se afoga perseguindo o brilho na superfície, o canto sedutor da sereia.
O investidor de verdade é aquele que aprende a mergulhar, a entender as correntes subterrâneas e a encontrar os tesouros que ninguém vê porque estão ocupados demais olhando para o lado errado.
Pergunte sempre: de onde veio o dinheiro? Essa pergunta simples é o farol que separa a riqueza duradoura da miragem financeira.
Atenciosamente,
Hugo Teixeira
Consultor de Valores Mobiliários Autorizado pela CVM; Especialista de Investimentos Certificado pela ANBIMA; Trader e Investidor Profissional há 17 Anos
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