Começo aqui uma série de posts dedicados à mais importante parte do trading, a psicologia, que junto com as técnicas de position sizing, são responsáveis por uns 75% do sucesso de um trader.
Nessa nova série, falarei basicamente sobre padrões de comportamento, “minha” teoria Doppelganger e outras frescuras emocionais humanas de uma forma geral.
E para começar escolhi falar de como nós não somos muito melhores do que os outros animais, como a nossa mente aprende as coisas, o porquê dessa forma de aprendizado ser ruim para quem procura construir uma mentalidade compatível com a de um bom trader e como cada momento no mercado é único e não relacionado aos anteriores.
Divirta-se!
Tudo Começa Com o Cachorro do Pavlov…

Vocês devem se lembrar da história do Pavlov na qual ele tocava um sino e dava carne pra um cachorro e continuava a fazer isso muitas vezes. Depois de um tempo só de tocar o sino, o cachorro salivava.
Isso acontecia pois o cachorro aprendeu (ou foi condicionado, se você parar pra pensar dá na mesma) que quando o cara toca o sino ele ganhará um pedaço de carne, ou seja, o cachorro começou a relacionar o barulho do sino com a carne. Apesar de hoje isso ser tão estupidamente óbvio quanto 2+2=4, naquela época parece que foi uma grande descoberta. 😛
Ok, mas era só um cachorro, seres humanos devem ter uma maior resistência, né? Né? O engraçado é que em alguns aspectos nós somos ainda mais burros do que os animais.
Não sei se alguém já leu aquele livro “Quem Mexeu no Meu Queijo?”

Esse livro conta a história de uns ratinhos, eles descobrem uma “mina” de queijo e ficam lá comendo de boa, mas quando o queijo acaba eles continuam lá feito uns idiotas enquanto os outros ratinhos procuram mais queijo, eu não lembro muito bem da história, mas não esqueço a mensagem:
É preciso aprender a se adaptar.
Será que somos bons em adaptação?
Em um experimento feito não lembro aonde foram comparados ratos com pessoas, cientistas colocavam queijo escondido para os ratos e quando eles o encontravam, obviamente o queijo era comido, no dia seguinte colocavam mais queijo e novamente os ratos faziam a festa, porém no terceiro dia não colocaram queijo e então os ratos iam procurar em outros lugares. No quarto dia eles nem olhavam mais o lugar que costumava ter a comida.
Para a parte com humanos, usaram dinheiro, no primeiro e no segundo dias as pessoas achavam o lugar e pegavam o dinheiro, e no terceiro dia os cientistas não colocaram nada, o foda é que, ao contrário dos ratos, vários dias depois as pessoas continuavam procurando o dinheiro no mesmo lugar!
A conclusão do estudo foi que os seres humanos se adaptam mais devagar às novas circunstâncias do que os ratos e por isso, não somos melhores do que os outros animais.
O Problema é Que a Gente Aprende as Coisas…

Imagine que você é um pivetinho de 4 anos que não sabe nada de porra nenhuma e seus pais também não quiseram te ensinar. Considere agora que você decide sair de casa para ir brincar no parquinho, chegando lá você encontra vários outros pivetinhos e todos brincam a tarde toda felizes e contentes que nem em um típico episódio de Os Ursinhos Carinhosos.
Então começa a escurecer, e você decide voltar para sua casa a pé e sozinho. Depois de andar apenas um quarteirão, uma mulher de uns 30 anos te oferece uma carona e você aceita, já que está cansado depois de tanta brincadeira. No caminho vão conversando sobre que tipo de bala vocês gostam mais e outras bobagens, chegando em casa, você dá tchau e vai pro seu quarto enquanto ela vai dar uma dura nos seus pais, logo depois, a mulher vai embora.
Na próxima semana acontece a mesma coisa, você fica até tarde no parquinho e volta no escuro.
Porém, dessa vez um cara com um avental levemente sujo de sangue com uns 50 anos que dirige um furgão branco te oferece carona. Você novamente aceita e durante o caminho todo, conversam sobre bobagens de crianças. Em casa vocês se despedem e ele também dá uma dura nos seus pais.
Lembrando que você é só um pivete que não sabe nada, logo, você não iria desconfiar do simpático açougueiro do bairro só porque ele tem um avental sujo e dirige um furgão. Não existe na sua cabeça as crenças e pré-conceitos que te fariam ter medo de uma pessoa assim.

Ok, agora você já teve duas experiências com estranhos, o que aprendeu?
Que quando um estranho te oferecer uma carona é bom aceitar pois eles são pessoas inofensivas e além disso, é mais rápido e confortável voltar de carro do que andar o caminho todo de volta. Como você nunca teve maus momentos com desconhecidos, sua mente vai generalizar. A primeira experiência cria a ideia de que TODOS os estranhos são boas pessoas e a segunda experiência reforça essa ideia.
Mas e se um outro pivete qualquer não tiver tido contatos anteriores com estranhos e a primeira experiência for ruim? E se um cara o convence a ir pegar balinhas na casa dele e quando chegam lá, o lugar é todo Silent Hillesco e ele faz o diabo à 4 com o pivete? Se ele sobreviver, o que acontece?
Como esse é o primeiro contato com estranhos, a ideia a ser formada é que TODOS os estranhos são ruins. Da próxima vez que encontrar um desconhecido, ele terá muito medo pois a cabeça dele aprendeu que essas pessoas são perigosas. Nesse caso, o medo serve como mecanismo de defesa…
Mas esse mecanismo é falho.
…Generalizando Tudo de Forma Idiota!
O problema da mente é que ela aprende as coisas muito rapidamente e forma crenças generalizando os dados, mesmo com uma mísera experiência, sem considerar outras possibilidades.
É como se eu apostasse em “cara” num cara-ou-coroa e acertando, acreditasse que em 100% das vezes que eu jogar esse jogo, vai dar “cara”! E foi o que aconteceu com os meninos, a mente do primeiro formou a crença de que todos os estranhos são bons e a do segundo, a de que todos são perigosos.
E agora?
O que acontecerá se o primeiro garoto conhecer um estranho perigoso?
Sua crença de que todos estranhos são legais será atacada por uma nova crença, a que diz que estranhos podem ser legais, mas nem todos. O mesmoa acontece com o segundo garoto se ele conhecer estranhos legais, a crença de que todos são pessoas ruins será atacada pela nova, a de que nem todos são ruins.
Qual delas prevalecerá vai depender da intensidade dos encontros.
O primeiro menino provavelmente aprenderá rápido, sua crença original perderá a força e ele começará a acreditar que nem todos estranhos são bons. Essa mudança pode ser muito difícil para o segundo menino pois ele teve uma experiência traumática. É possível que se passem anos até que ele possua experiências positivas o suficiente para começar a acreditar que nem todos os estranhos são ruins.
O Que Isso Tem a Ver Com a Bolsa é o Seguinte:
Quem controla os mercados? Todas as pessoas que os compõe, guardadas as devidas proporções. E elas fazem as mesmas coisas o tempo todo? Não, elas podem fazer coisas parecidas o tempo todo, mas nunca EXATAMENTE a mesma coisa. Para que algo assim aconteça, todos que participarem no mercado precisariam repetir com uma precisão de 100% o que fizeram no passado e isso não acontece.
Logo, todo trade é único e sem qualquer relação à trades feitos anteriormente, mesmo se os gráficos, preços e volume forem iguais eles serão diferente apenas porque não são as mesmas pessoas.
Também é impossível saber se um trade dará lucro ou prejuízo, não tem como saber pois o resultado depende das atitudes de todas as pessoas do mercado. Acreditando que é possível saber o que acontecerá num trade, você está se iludindo pois quem pensa assim está dizendo para si:
Eu sei o que todos os outros traders estão fazendo agora e o que eles irão fazer no futuro, como posso ler mentes e prever o futuro, tenho certeza de que meu trade dará certo!
E como já expliquei em um outro tópico, esse pensamento é ridículo, mas muitos traders acreditam nisso, mesmo não estando conscientes.
Então se cada trade é diferente e único, nossa habilidade de aprendizado que relaciona fatos passados e presentes não serve para nada. Portanto o medo de “errar” um trade é apenas uma resposta emocional pouco útil de nosso sistema nervoso.

E como não tem como saber o que irá acontecer numa certa operação, você não deveria sentir medo.
Porque deveria? Em um jogo de cara-ou-coroa (eu sei, eu vou parar) em que você escolhesse “coroa” várias vezes, mas a moeda dá “cara”, você iria sentir dor emocional por estar “errado”? Ficaria com medo de errar? Claro que não, pois você sabe que a probabilidade de sair cada um dos lados é de 50%. O máximo que você pode fazer é escolher quanto vai jogar, quando vai começar e quando vai parar, só isso!
E se você tiver medo de perder dinheiro? Bem, você sabe que nos mercados não há nada 100% certo, logo existe sempre a possibilidade de perder dinheiro, você sabe disso, portanto esse medo pode significar duas coisas, ou você não confia em si mesmo, tem algum problema de auto-estima e pensa que não merece ser feliz, ou não confia em seu sistema, se é que tem um, lembrando que um sistema não é feito apenas de pontos de entrada.
Se seu problema é falta de confiança em si mesmo eu só posso sugerir que você pratique mais trades, mesmo com capital reduzido. Agora, se o problema é com o seu sistema, talvez ele não tenha uma expectativa positiva, então teste-o.
Era Uma Vez… Um Trader Frustrado!

Hora do exemplo! \o/
Considere um sistema de “trend-following” que foi 100% testado, tem boa expectativa, boa quantidade de oportunidades e apresenta em média 40% de vencedores e 60% de perdedores.
Um trader chamado Erisclêudison começa a usar esse sistema e perde dinheiro no primeiro trade, normal, perde no segundo e no terceiro, faz um lucro pequeno no quarto, e no quinto e sexto é stopado imediatamente, até agora, apesar de serem poucas operações, o resultado ainda está dentro do esperado, mas mesmo sabendo disso ele começa a ficar desconfortável.
Erisclêudison perde também no sétimo. Quando chega no oitavo ele fica com medo e começa a hesitar, mas sabendo que foram pouquíssimos trades até agora para fazer uma média e que o sistema dele é bom, consegue fazer o oitavo trade, mas perde novamente. Na hora de puxar o gatilho para o nono trade ele está tão decepcionado com ele mesmo e com seus sistema que ele pensa:
Ok, eu vou fazer só mais 1 trade, mas se não der certo também, vou mandar tudo isso pra pqp!
O nono trade não dá certo e ele desiste definitivamente. Poucos dias depois o mercado pára de dar falsos-rompimentos e resolve “trendar” fortemente. Se ele continuasse a seguir seu sistema fielmente, ele teria pego a onda e saído no lucro, provavelmente até compensado os trades perdedores. Era só um losing-streak, extremamente comum. Mas ele desistiu.

O que aconteceu aqui?
Simples!
O sistema de aprendizado de Erisclêudison estragou tudo, ele acabou desenvolvendo a crença de que: “meu trade será um perdedor” pois sua mente foi relacionando os trades às perdas financeiras, e um outro sistema, o de defesa, para impedí-lo de continuar perdendo dinheiro foi gerando respostas emocionais de medo e dor, forçando-o a desistir.
Como Erisclêudison não sabia nada de psicologia ele não percebeu o que estava acontecendo e acabou se rendendo ao seus sistemas mentais em vez de continuar seguindo corretamente seu sistema de trading. Nós fomos naturalmente “programados” a falhar nos mercados, mesmo quando alguns de nós tem “personalidades boas para o trading”…
O Que Você Pode Fazer Agora?

Agora com essas novas informações, sempre que você estiver seguindo seu sistema corretamente mas, depois de alguns trades perdedores, começar a ficar com medo de apertar o gatilho, você se lembrará do que aprendeu aqui e assim terá bons motivos para continuar fazendo o que deve se feito.
Releia esse post, estude muito os livros: “Trading in the Zone” e “The Disciplined Trader” do Mark Douglas, ele aprofunda muito o assunto, dedique-se, lembre-se sempre das lições aprendidas, uma hora sua mente irá se adaptar e você não irá mais hesitar, ou sentir medo e dor.
Você não desenvolverá essas crenças necessárias para ter a mentalidade de um bom trader de uma hora para a outra ou muito facilmente, mas quando você conseguir, todo o trabalho terá valido a pena e, aliado à um bom sistema de trading o sucesso chegará mais cedo ou mais tarde.
Agora vai estudar, porra! 😀
E você? O que achou? Se quiser acrescentar alguma coisa, comente!
Ola , parabens pelas informações e esta bem na linha que estava procurando.
Estou interessado em Audio com treinamento de controle das emoções no molde de PNL em Operações de Trade Compra e Venda no mercado de Açoes e Indices.
Voce tem alguma arquivo ou informação neste sentido?
Qualquer materia ou dica mande pelo : [email protected]
Me despeço, porem antes, deixo um forte abraço.
Alver Zambon
Olá Alver!
Eu não estou muito familiarizado com PNL para Trading, mas se encontrar alguma coisa eu te aviso.
Ahh, e se você quiser atualizações do site, basta assinar o feed rss, para isso basta ir em: http://www.senhormercado.com.br/feed/rss/ e clicar em subscribe now.
Qualquer coisa, só perguntar.
Abraço!
Cara ótimo esse texto, realmente foi o que aconteceu comigo em minha primeira experiência com a bolsa que se deu um pouco antes da crise de 2008.
Fiquei frustrado pelo montante que perdi, e parei de operar por um tempo e só fui voltar mesmo agora a pouco.
Se tivesse estudado sobre psicologia de trading na época talvez não houvesse fugido com o rabito entre as pernas.
¬¬
Melhor que muito livro, agora se me permite uma critica construtiva, pense em retirar as palavas pouco adequadas a esse texto, que devido a elas quase parei de ler, achando que se tratava de algo banal, abs e parabens
Pois eu gostei dessas palavras, deixa o texto bem mais leve. E lembre-se: Toso mundo pensa diferente.
Só em 2018 !!
Opssss !!!
Comentei no post errado …..
Um bom texto. Pelo jeito vou ler o blog todo.
Até o tipo de humor parece com o meu kkkk.
abraço,
PJ
Ótimo texto! Parabéns!!
Parabéns. Muito didático o texto. E com exemplos que ajudam a entender. Informações preciosas
Antônio da Rocha Rogatto
É sem dúvida fundamental, a parte psicológica, para traders e investidores.
A maneira como você aborda o assunto de forma mais descontraída e com exemplos engraçados fica mais agradável de aprender.
Parabéns
Muito bom o artigo. Assinei o Vapt Vupt somente há alguns, mas, por um acumulo de circunstancias outras ainda não dei inicio.
Estou com 80 bem vividos e tudo que seu texto diz reforça o que a vida e leituras me ensinaram em outras áreas
Muito bom. Realmente é complicado enfrentar os stops. Estou começando e ainda não me acostumei.
Olá. Sou psicologia comportamental e estou entrando como psicóloga na área do mercado de ações.
Teria alguma referência bibliográfica para me indicar?
Obrigada.
Na verdade não são vários ratinhos. São dois: Scully e o outro que esqueci no nome. Um deles se contenta com a montanha de queijo e o outro percebe que ela pode não durar pra sempre e sai à procura de outras fontes de queijo. Um deles se acomoda e o outro não. O interessante é que o rato empreendedor acaba convencendo o amigo acomodado e agora deprimido (porque a montanha acabou), a juntar-se a ele nessa nova empreitada de descobertas. Pra mim, a moral da estória foi: “Não se acomode nunca, jamais, numa única montanha de queijo, porque um dia ela VAI acabar”
Obviamente é uma analogia sobre a acomodação profissional e econômica de muitos.